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Jogo de Posição ou Jogo de Sustentabilidade?

  • Foto do escritor: Pedro Mendonça
    Pedro Mendonça
  • 22 de jul. de 2024
  • 4 min de leitura

Se pudesse resumir em uma palavra o que pra você significa a cultura de jogo intitulada “Jogo de Posição/Localização (ou em espanhol, Juego de Posición/Ubicación), qual seria essa palavra? Para mim seria sustentabilidade.


Vejo e leio muitas pessoas dizendo que essa forma de atuar é excessivamente engessada, mecânica, e que limita a criatividade do jogador(a) de futebol. Será mesmo isso? Ou estamos deturpando o verdadeiro significado desse jogar?! Não tenho a mínima pretensão de falar em nome do Jogo de Posição, seria uma heresia pretender tal coisa, porém vou deixar nesse texto a minha opinião, e levantar exemplos que justificam o meu pensamento.


Em primeiro lugar temos que definir o que é a criatividade. Segundo o dicionário Aurélio, criatividade significa “capacidade criadora; engenho, inventividade”. Já o Professor Sir Ken Robinson, defensor da escola criativa, a define como o “processo de gerar ideias originais que tenham valor”. Fato é, que para termos comportamentos criativos que façam sentido dentro do contexto que vivemos precisamos de parâmetros, exemplos e, inclusive limites.


Bem, depois dessa primeira definição, temos também que ter claro o significado de liberdade e libertinagem, pois muitas vezes são confundidos. Liberdade é o “poder de agir, no seio de uma sociedade organizada, segundo a própria determinação, dentro dos limites impostos por normas definidas, enquanto Libertinagem significa desregramento, ou seja, o que não tem regra ou aquele que não respeita regras (libertino).

Óscar Cano, treinador espanhol e figura importante na conceptualização do Jogo de Posição, diz que “somos livres à medida que nos coletivizamos”. Levando isso em consideração, existe exemplo de coletividade e sociedade/equipe organizada melhor no futebol do que aquele Barcelona de Pep Guardiola?! Aquela equipe dominou o cenário mundial não apenas com títulos, mas também com uma forma de jogar singular, onde todos respeitavam regras simples, e com isso, otimizavam não só suas possibilidades enquanto equipe, mas também, e principalmente, à nível individual.

Óscar Cano, na época em que dirigiu o CD Castellón.



Evito ao máximo falar de códigos de ação/conceitos do JdP de maneira isolada, porque entendo que se conformam entre si e perdem o sentido quando explicados de forma separada, sendo até difícil falar de um sem que outro não seja necessário para dar significado. Mesmo assim, vou “isolar” dois dos muitos comportamentos vistos com frequência em equipes que praticam o JdP para explicar o porquê do substantivo escolhido no início do texto. O primeiro é o conceito de Fixação, principalmente em espaços mais distantes à zona da bola em situações de disposição, conhecidos também como espaços de cooperação (Seirul-lo).


Para realizar esse comportamento nesse tipo de circunstância, o jogador(a) deve ter entre muitas qualidades, humildade, empatia, paciência e uma sensibilidade coletiva forte, já que a bola normalmente é um atrator, e estar longe desse imã esférico pode ser torturante. É necessário pensar no bem daquela pequena sociedade, e não só nos seus desejos.


É preciso entender que dois dos grandes tesouros de um esporte cada vez mais competitivo são espaço e tempo, e abrir mão de estar próxima a bola pode proporcionar a companheiros essas duas riquezas. Independente do nível da prática dos que jogaram e jogam futebol, quem nunca ouviu aquele famoso “toca e sai” ou “toca e movimenta”?! Ok! em alguns momentos sim que é necessário fazer isso, mas em outros tantos não.

E jogadores como Iniesta, Xavi, Busquets, Ganso, e vários outros, assim como equipes, nos mostram que o contrário também é valido. Essas intenções, independente das que sejam, devem vir conectadas com as intenções coletivas da equipe. E uma vez que intenções coletivas são realizadas de forma fluída e natural por todos os integrantes, é só uma questão de tempo para que todos possam disfrutar desse bem comum (espaço e tempo). E aí o “individual” é otimizado. Através do pensamento geral.


Quando jogadores com alto grau de empatia se unem, tornam o seu ambiente autossuficiente e sustentável. E o que seria um jogador sustentável? Segundo Juanma Lillo, outra grande referência no assunto, é o jogador que aumenta as suas possibilidades sem diminuir as dos outros. Estamos falando da vida cotidiana ou do futebol? Estamos falando dos dois, pois o JdP é mais do que uma cultura de jogo, é uma filosofia de vida.


Henry e Pedro Rodríguez mantém posição em amplitude nos corredores lateral esquerdo e direito, respectivamente. E Eto’o controla profundidade, fixando central rival.



Como disse antes, é difícil falar de conceitos por separado (ainda mais quando falamos de um que é difícil “perceber”), e o segundo abordado nesse texto acaba por ser, segundo meu ponto de vista, a matriz fundamental do Jogo de Posição, o que “existe” intrinsicamente em todos os outros conceitos que conformam essa cultura de jogo: a relação Benfeitor x Beneficiário.


Essa dualidade está presente no jogo de futebol, mas ainda mais evidente em equipes que tendem a elaborar o seu jogar à partir da bola. Quando um zagueiro conduz para atrair um rival, por exemplo, ele não apenas está executando uma ação motora, nesse movimento há uma intenção, que pode ser a de proporcionar tempo e espaço a companheiros mais próximos da baliza oposta. Mas nesse mesmo fragmento de tempo o jogador que no momento ainda não recebeu a bola, pode estar com a sua localização proporcionando os mesmos benefícios que em breve irá ganhar. Imaginem pensamentos solidários e empáticos como esse, de maneira contínua, durante todo o tempo do jogo, e não só em situações de disposição da bola, mas também em momentos de recuperação. Essa pequena sociedade pode ser muito mais forte.


Iniesta e Xavi, exemplo de jogadores que entendiam muito bem essa dualidade durante o jogo.


Afinal, o jogo de futebol pode ser uma ótima oportunidade de expansão dos nossos pensamentos em relação a vida. Não deveríamos reduzir o significado dele apenas a derrota e a vitória. Ali, dentro das “quatro linhas”, existe a possibilidade de alcançar o mundo ideal através da maneira que esse jogo é feito, de como é (re)criado.

Esses pouco mais de noventa minutos podem transformar positivamente o entorno dos que participam jogando ou estando dentro do processo, e também dos que estão vendo. Nesse período, essa pequena parte do mundo pode ser transformada para melhor.


Será que a cultura do jogo de posição pode proporcionar isso? Acredito muito que sim.

 
 
 

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